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República Centro-Africana: uma missão interminável para promover as normas humanitárias

Massacres e atos de violência física cometidos contra civis, destruição de casas e comércios, ataques contra socorristas: a lista de violações ao Direito Internacional Humanitário (DIH) que acontecem de forma quase diária é longa. Assim como é necessário que medidas de emergência sejam tomadas para salvar vidas, é essencial que os portadores de armas sejam convencidos de que devem obedecer as normas que protegem os civis.

"Difundir o conhecimento sobre as normas básicas do Direito Internacional Humanitário (DIH), como as que proíbem os ataques contra pessoas que foram feridas ou estejam em veículos de saúde, é uma das prioridades da organização na República Centro-Africana”, afirmou o chefe da delegação do CICV em Bangui, Jean-François Sangsue. “A atuação das partes no conflito impacta diretamente nas vítimas. Portanto, as partes devem conhecer as normas. Devem respeitá-las e fazer observar o respeito por elas."

O desafio é enorme. Como é possível conservar um mínimo de humanidade quando o ódio é tão forte, quando o desejo de vingança é tão grande que parece justificar qualquer coisa? Como é possível ensinar as normas básicas do DIH a grupos armados ou a civis que pegam em armas quando o país está no meio do caos e perigo e infestado pela corrupção? São dificuldades como estas que a organização se empenha em superar, todos os dias, na República Centro-Africana por meio de um trabalho humanitário neutro e imparcial e do diálogo regular com as partes no conflito e com todos os envolvidos na violência armada. A meta é dupla: promover um maior respeito pelas normas do DIH e pelas que são aplicáveis nas operações de aplicação da lei e permitir ao CICV, à Cruz Vermelha Centro-Africana e a outros componentes do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho acesso seguro aos detidos e a outras pessoas que precisam de ajuda. As reuniões entre o CICV e os portadores de armas (grupos armados, forças internacionais, gendarmaria, forças policias e civis armados que participam dos combates), ora organizados como cursos de treinamento, ora como palestras adaptadas para cada público, visam fomentar um maior respeito e proteção dos feridos, doentes, detidos e população em geral.

Desde o começo do ano, centenas de colaboradores dos grupos armados anti-Balaka e anti-Séléka assistiram a palestras, em Bangui e em outros lugares, sobre os princípios básicos do DIH, como a proteção da população civil e o respeito pela dignidade humana e pelos serviços de saúde. Em Bambari, Kaga Bandoro, Kabo, Dekoa e Boda a mesma mensagem foi repetida a estas partes no conflito.

Área de Kaga Bandoro. Ex-membros do grupo armado anti-Balaka recebem instruções sobre princípios humanitários. © CICV/Barthelemi Saouré

"Este é um esforço de longo prazo”, disse Sangsue. “O contato deve ser mantido constantemente, e temos que explicar, informar e promover de forma incansável o respeito pelas normas do DIH. Um maior conhecimento da lei pode ajudar a impedir a sua violação."

 

O CICV também está em contato com todas as forças estrangeiras, regionais e multinacionais na República Centro-Africana. Tanto na época da Missão Internacional de Apoio à República Centro-Africana (MISCA), liderada por países africanos, como antes da Missão Multidimensional Integrada de Estabilização das Nações Unidas na República Centro-Africana (MINUSCA), alguns contingentes de militares e policiais dos países que contribuíram com tropas compareceram a palestras sobre o Direito Internacional Humanitário e Direitos Humanos. Em alguns países, a instituição proporciona treinamento para as tropas que sairão a uma missão da ONU antes da sua partida, como no caso dos contingentes de Ruanda, do Senegal, do Camboja e da Tunísia. 

Dois dias depois do começo oficial da missão da ONU na República Centro-Africana, o CICV se reuniu com os comandantes dos contingentes e com oficiais superiores da MINUSCA para discutir certos problemas humanitários e a cooperação esperada entre o braço militar da MINUSCA e a organização, como foi feito anteriormente com a MISCA. O CICV também está em contato regular com a Força da União Europeia (EUFOR) e com a força Sangaris da França, parte no conflito.
 

"Desde o começo de setembro, as forças de segurança do país passaram por treinamento e reformulação", disse Anand Appadoo, delegado do CICV responsável pela formação de unidades policiais. "Estamos envolvidos na capacitação de mais de 300 profissionais centro-africanos da polícia e da gendarmaria. O foco está em aprender como se comportar de acordo com o Direito Internacional dos Direitos Humanos."
 

Como os civis também participam da violência, o CICV se empenha em conscientizar sobre as normas humanitárias em bairros e aldeias. Em Bangui, Ndélé, Kaga Bandoro e Bambari, organizaram-se reuniões ocasionais com líderes comunitários e religiosos e com organizações de jovens em que foram discutidos os problemas humanitários e as normas mais básicas da humanidade – aquelas que todos devem obedecer.
 

Em cooperação estreita com a Cruz Vermelha Centro-Africana, o CICV compartilhou seu conhecimento de técnicas de resgate e assistência à saúde de emergência com representantes comunitários e membros de grupos armados. Uma vez que a maioria destes nunca recebeu treinamento sobre primeiros socorros, eles não podem proporcionar atendimento adequado às vítimas dos combates. Tanto para combatentes como para civis, as habilidades de salvar vidas são mais importantes ainda devido ao fato de que os poucos estabelecimentos de saúde no país que não perderam todos seus profissionais ou foram destruídos frequentemente estão localizados longe das zonas de combate.

Bangui (Academia de Polícia). O CICV participa do treinamento de policiais e gendarmes da República Centro-Africana. © CICV/Romaric Bekourou

Entre 21 de agosto e 25 de setembro de 2014, em cooperação com a Cruz Vermelha Centro-Africana, O CICV:

  • atendeu mais de 11 mil pacientes, cobriu o custo de hospitalização de mais de 350 pacientes e realizou mais de 90 cirurgias e mais de 90 partos em hospitais e outros estabelecimentos em Bangui, Kaga Bandoro e as proximidades;
  • reuniu oito crianças com as suas famílias separadas pelo conflito, incluindo uma criança que esteve em um grupo armado, e restabeleceu o contato entre 25 indivíduos e outros membros das suas famílias;
  • forneceu ao centro de detenção em Bangui material médico básico suficiente para tratar até mil pessoas;
  • construiu um reservatório de água de 70 mil litros para aumentar a capacidade de armazenamento em um local no aeroporto onde se encontram pessoas deslocadas;
  • conscientizou mais de 21 mil pessoas sobre práticas higiênicas e sanitárias adequadas;
  • forneceu água potável todos os dias para 10 mil pessoas no hospital de Ndélé e no restante da cidade;
  • forneceu ajuda alimentícia para quase 17 mil pessoas deslocadas em sete locais em Bangui;
  • vacinou 3 mil cabeças de gado na área de Kaga Bandoro contra a pleuropneumonia bovina contagiosa.

Nesse período, os colaboradores do CICV também visitaram mais de 400 detidos para avaliar o tratamento que estavam recebendo.

 

Mais informações:
Barthelemi Saouré, CICV Bangui, tel. +236 75 27 25 79 ou +236 72 69 81 87
Marie-Servane Desjonquères, CICV Genebra, tel. +41 22 730 31 60 ou +41 79 574 06 36