Prêmio de CICV de Cobertura Humanitária Internacional: discurso da chefe da Delegação Regional
Discurso de Simone Casabianca-Aeschlimann, chefe da Delegação Regional do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) para Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai.
Cerimônia de entrega do Prêmio CICV de Cobertura Humanitária Internacional
São Paulo, 06 de novembro de 2018
Senhoras e senhores,
Era 2004 e o conflito em Darfur, no Sudão, havia acabado de começar. Alguns colegas e eu fomos em missão ao vilarejo de Fata Borno e nos deparamos com um cenário de total destruição, com muitas casas queimadas. Pessoas foram mortas e muitas mulheres foram violentadas. Conheci e me comovi com uma dessas vítimas: a Fátima. Ela foi atendida pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha.
Assim como Fátima, outras mulheres foram vítimas do conflito. Da mesma forma como Fata Borno, outros tantos vilarejos foram atacados em Darfur. Olhando de longe, muitos de nós sequer tomamos conhecimento do que acontece nos mais diversos contextos de conflito munda afora – inclusive neste momento. Olhando de perto, como tive a oportunidade, as vítimas ganham rosto e nome // e os bombardeios, endereços precisos.
Nós, trabalhadores humanitários vivenciamos situações como essa. No entanto, entender e ajudar pessoas afetadas pela violência ou por catástrofes não é tarefa apenas de organizações humanitárias. O jornalismo, que tem um papel importantíssimo na nossa sociedade, tem uma enorme responsabilidade de visibilizar essas questões, de dar voz a essas pessoas... Enfim, de humanizar sua cobertura.
O noticiário sobre temas geopolíticos ou militares de um conflito armado é, sem dúvidas, fundamental para a nossa compreensão dos acontecimentos. Mas acredito que a imprensa pode ir além. A muitos quilômetros de distância da sala de reuniões onde importantes decisões são tomadas, milhares de pessoas sofrem as consequências das guerras e da violência armada; além das trincheiras e das frentes de batalha, muitas pessoas são afetadas pelos impactos do conflito a todo o tempo. É importante dar rosto a essas histórias. Ir além do front e chegar às vítimas!
É esse jornalismo, que coloca o ser humano em primeiro plano, que traz nova compreensão ao público. Pode parecer que uma realidade tão distante desta aqui não crie conexão ou empatia para os brasileiros, mas isso não é verdade. Não importa a distância geográfica ou cultural, uma cobertura humanitária resultará essencialmente em gente tendo acesso a histórias de gente. É isso que vai conectar o brasileiro à história de um rohingya ou de um somali.
Senhoras e senhores,
Ficamos muito contentes em observar na segunda edição deste prêmio o panorama da cobertura de temas humanitários na imprensa brasileira e verificar que há um importante volume de reportagens sobre esses assuntos. Recebemos quase 50 inscrições, número que para este momento inicial da premiação é positivo, já que esse tipo de cobertura requer investimento dos meios de comunicação para ser desenvolvida.
Obsevamos algumas tendências no material inscrito. Temas de migração foram os mais presentes nas reportagens – inclusive os três finalistas abordam, de diferentes formas, esse assunto. Outra característica que verificamos foi que a imprensa buscou temas internacionais aqui mesmo no Brasil. Muitas pautas retrataram tanto o drama do processo migratório como a realidade e os desafios enfrentados por migrantes e refugiados aqui no Brasil. Claro, sempre há os meios de comunicação que saíram do país e foram ver de perto outros dramas humanitários mundo afora.
A qualidade dos trabalhos inscritos é um motivo particular de satisfação e, com certeza, representou um desafio para nosso corpo de jurados, que teve a tarefa de selecionar e julgar os trabalhos mais compatíveis com a nossa proposta.
Agradeço a Cristiana Mesquita, Paulo Braga e Sandra Lefcovich pelo trabalho criterioso de vocês. Tenho certeza que chegamos a um trio de finalistas de alto nível!
Claro que há espaço para mais crescimento dessa cobertura. E por isso queremos seguir com novas edições desse prêmio: para incentivar que ainda mais reportagens enfoquem o lado humano dos conflitos armados e das situações de violência mundo afora.
Nós, do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, temos nos esforçado ao longo dos últimos anos para fomentar essa cobertura humanizada na cobertura de conflitos de violência. Foi por essa razão que criamos o Prêmio CICV de Cobertura Humanitária Internacional. Para reconhecer devidamente os jornalistas que foram além para trazer ao público essa outra perspectiva no noticiário internacional. E para que o público brasileiro tenha uma noção mais aproximada do impacto que uma guerra ou uma situação de violência armada pode ter na vida de outro ser humano.
Parabéns aos inscritos nesta edição do prêmio e, em especial, às equipes do canal de notícias GloboNews, do portal Metrópoles e da TV Brasil! Vocês brindaram o público brasileiro com um conteúdo profundo, com apuro técnico, com sensibilidade e, sobretudo, com histórias de pessoas!
Boa noite!