A reabertura da fronteira entre Brasil e Venezuela, em junho de 2021, após 15 meses de bloqueio como medida de prevenção à pandemia, representou um novo momento de adaptação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) para a continuidade das atividades desenvolvidas no lado brasileiro da fronteira, localizado em Roraima
Em 2021, a organização aumentou seu alcance para garantir as operações, as respostas às necessidades e a proteção das populações afetadas e colaboradores. A resiliência e capacidade de resposta do escritório aberto no estado trouxeram resultados expressivos no apoio a migrantes, nas buscas e contatos com familiares, bem como na transmissão de documentos. Garantir o acesso à água potável e a estruturas de saneamento dignas foram outros grandes focos de trabalho.
"A população migrante está em situação de alta vulnerabilidade. Por isso, tivemos que adaptar nossa forma de trabalho para proteger funcionários e população atendida, mantendo nossa operacionalidade na região. Não paramos de trabalhar durante a pandemia", conta o chefe de Operações da Delegação Regional do CICV para Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai do CICV, Laurent Reza Wildhaber.
Nos municípios de Boa Vista e Pacaraima, o CICV fez adequações às atividades com protocolos específicos que buscassem manter a proteção das pessoas diante da continuidade da pandemia. Com isso, foi possível, garantir não apenas o funcionamento, mas também a ampliação da Proteção de Vínculos Familiares — serviço prestado em vários países pelo Comitê para contribuir com a manutenção dos vínculos familiares e evitar desaparecimentos, permitindo que pessoas em situação de vulnerabilidade informem às suas famílias sobre seu paradeiro e mantenham contato com os entes queridos por meio de serviços de conectividade, como chamadas telefônicas, acesso à internet e recargas de bateria, e de buscas familiares.
Atendimento do Serviço Restabelecimento de Laços Familiares é adaptado para funcionar durante a Pandemia. Foto: Benjamin Mast/CICV
"O cuidado com o migrante é importante em toda a região e vai continuar sendo nos próximos anos. Queremos realmente que os vínculos entre famílias sejam mantidos como uma unidade que tem de ser protegida. A capacidade das pessoas de estar com sua família, de se comunicar com seus familiares, de permanecer em contato apesar da migração, apesar da violência armada, é algo importante para sua resiliência e capacidade de enfrentar as adversidades", destaca Alexandre Formisano, chefe da Delegação regional do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) para Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai.
A maior parte das pessoas atendidas pelo CICV, no norte do Brasil, vem da Venezuela, e, por essa razão, a maioria das ligações e contatos são feitos para este país. Em segundo lugar, aparecem chamadas feitas para dentro do território brasileiro, uma vez que muitos familiares de migrantes já seguiram para outras regiões do Brasil. O papel do CICV torna-se ainda mais relevante diante do fato de que 80% dos usuários dos serviços ofertados não possuem telefone e, dos que possuem, apenas 30% possuem acesso à internet no aparelho. Além disso, quase metade dos usuários dos serviços (48%) tem o RLF como único meio de comunicação com seus familiares.
"Os serviços de restabelecimento de laços familiares são essenciais para as pessoas migrantes, e precisam ser adequados a cada realidade. No caso de migrantes indígenas vivendo em abrigos, por exemplo, é muito importante termos regularidade nos dias em que oferecemos nosso atendimento. Muitas de suas famílias vêm de áreas bastante remotas na Venezuela, com sinal de celular instável, e compartilham aparelhos celulares entre as pessoas da comunidade. Assim, os familiares já ficam a postos nos dias em que disponibilizamos os serviços de telecomunicações, esperando o contato de um ente querido no Brasil", explica Viani González, chefe do escritório do CICV em Roraima. Ela acrescenta que, durante 2021, a equipe ofereceu atendimento diário ou semanal, para proteção dos vínculos entre famílias em mais de 25 espaços entre Boa Vista, Pacaraima e Manaus.
O restabelecimento de contatos entre familiares também aconteceu a partir da resolução de casos de busca de familiares desaparecidos. Em 2021, o CICV apoiou ajudou mais 33 familiares migrantes a saber o paradeiro de seus entes queridos.
Em Manaus (AM), onde o RLF também é ofertado a migrantes em postos de conectividade, o CICV apoiou, ao longo do ano, a transferência do serviço para a Cruz Vermelha Brasileira (CVB). O chefe do escritório do CICV em Roraima, Michael Pfister, explica: "em outros países, em geral, esse serviço é oferecido pela Cruz Vermelha nacional", comenta. Em 2022, a expectativa é que CICV e CVB aumentem ainda mais seu trabalho conjunto no norte do país, de modo que a CVB também passe a gerir ao menos parte dos serviços ofertados em Roraima.