Comunicado de imprensa

Brasil: relatório inédito revela consequências do desaparecimento de pessoas

Documento faz recomendações às autoridades e à sociedade brasileira

Brasília (CICV) – O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) lança nesta terça-feira (6) o relatório "Ainda? Essa é a palavra que mais dói", com uma avaliação aprofundada das múltiplas necessidades de familiares de pessoas desaparecidas no estado de São Paulo. O documento apresenta a complexidade do fenômeno de desaparecimento de pessoas no Brasil e faz uma série de recomendações às autoridades responsáveis para promover respostas adequadas a essas necessidades.

"Com este relatório, buscamos nos aprofundar e sintetizar as principais necessidades de quem busca por um familiar que desapareceu", explica o chefe da Delegação Regional do CICV para o Brasil e países do Cone Sul, Alexandre Formisano. "Além de lutarem para encontrar uma resposta sobre o que aconteceu, essas famílias passam a ter necessidades em várias outras áreas de sua vida. O desaparecimento tem consequências psicológicas, financeiras, jurídicas, sobre a segurança e também sobre saúde física. É importante que essas famílias tenham apoio das autoridades e da sociedade e é por isso que esse relatório traz uma série de recomendações", complementa.

O desaparecimento de pessoas é um problema global amplo, heterogêneo e com poucas estatísticas. No Brasil, os registros passaram a integrar o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), desde 2017 e vem registrando uma média de aproximadamente 80 mil boletins de ocorrência sobre esse problema a cada ano.

No relatório, o CICV faz recomendações a partir da necessidade e o direito de saber o paradeiro do ente querido desaparecido, cuidados com a saúde física e psicossocial, reconhecimento, tratamento igualitário e justiça, necessidades legais, administrativas e financeiras. Embora no Brasil haja uma variedade de instituições e organizações que trabalham com o tema do desaparecimento.

"O desaparecimento de pessoas no Brasil e no mundo é uma realidade de muitas peças e elas ainda estão mais dispersas do que seria desejável. Há muitas autoridades com papel relevante a cumprir, e há também várias pontes a construir entre elas, entre as autoridades e a sociedade civil e entre as famílias e os serviços e grupos que podem apoiá-los", avalia Larissa Leite, coordenadora do Programa para Pessoas Desaparecidas e suas Famílias do CICV no Brasil. "Cada uma dessas peças importa. Quanto mais essa peças puderem estar próximas, maiores as chances de localizar quem desapareceu e reduzir o sofrimento dos familiares durante a busca", complementa Rita Palombo, coordenadora de Proteção da Delegação Regional do CICV, que destaca o impacto do problema na sociedade como um todo.

Para Francisca Ribeiro dos Santos, que busca por seu filho Hugo desde 2007, o relatório sintetiza as necessidades tanto dela como de outras famílias e apresenta recomendações práticas que poderiam ter evitado sofrimentos dos primeiros anos de busca, quando ainda faltavam informações básicas para ela. "O que vocês fizeram foi entregar em nossas mãos uma cartiha do aprendizado. Eu simplesmente classifico este livro como uma dádiva, porque em todos os lugares em que fui, em todas as portas que bati, não encontrei nada parecido. Vocês mostraram a porta certa que a gente pode bater", disse.

O Relatório

Para este estudo, o CICV se concentrou no estado com maior números de casos, São Paulo, segundo dados dos Anuários de Segurança Pública. Outro dado destacado no relatório é de um estudo realizado pelo Programa de Localização e Identificação de Desaparecidos (PLID), do Ministério Público de São Paulo (MPSP) em parceria com o FBSP: de 23.726 boletins de ocorrência registrados em São Paulo em 2017, foi verificado que 60% das pessoas registradas como desaparecidas eram homens e 40% mulheres. As faixas etárias que mais concentraram esses casos foram a de 14 a 19 anos (5.394), seguida de 30 a 39 anos (4.389), e 20 a 29 (4.252).

O CICV acompanhou de maneira constante e próxima, com entrevistas coletivas e individuais, um grupo de 27 familiares de pessoas desaparecidas a fim de se aprofundar nesses casos e compreender suas necessidades. Também foram ouvidos 18 servidores públicos com experiência no atendimento a casos de desaparecimento e seis líderes e colaboradores de associações de familiares de pessoas desaparecidas.

Para o CICV, a realidade dos familiares de quem desaparece é o ponto fundamental para orientar as ações relacionadas ao desaparecimento. São eles que conhecem, na maioria dos casos, os fatos essenciais para a busca, os que sofrem as consequências da ausência e, logo, os que podem falar melhor sobre suas necessidades. Por isso, o CICV enfatiza a importância da participação dos familiares em todo o processo de busca por soluções e melhorias no sistema para enfrentar a problemática do desaparecimento.

A análise do Comitê Internacional da Cruz Vermelha é a de que a realidade é complexa, as portas de acesso que os familiares precisam bater por conta própria são muitas e ainda precisam ser melhor coordenadas. Suas necessidades ainda estão negligenciadas, mas as experiências já existentes em São Paulo felizmente apontam para bons caminhos, com base nos quais consideramos muito factível implementar as recomendações do relatório.

Sobre a Avaliação de Necessidades: No desenho e implementação de um programa dedicado as pessoas desaparecidas e suas familias, o CICV inicia realizando uma avaliação das necesidades das familias que estão procurando seus entes queridos que estão desaparecidos. O CICV tem feito este trabalho minucioso em países como México, Colómbia, Peru, Sri Lanka, África do Sul, Iraque, entre outros Iraq entre outros paises. Isso permite ouvir das familias o que precisam e definir as prioridades da institução a partir destas necessidades especificas, orientando nosso programa ao contexto delas.

Baixe aqui o relatório completo

NOTAS AOS EDITORES:

Mais informações:
Sandra Lefcovich, CICV Brasília, (61) 98175-1599, slefcovich@icrc.org